domingo, 22 de agosto de 2010

MOSTRA BRASIL AFRO 2010



Difundir a cultura afro brasileira e estimular a livre manifestação artística, estas e outras propostas fazem do V Salão Nacional de Fotografias - "Brasil Afro". Nesta edição os participantes podem apresentar trabalhos que mapeie e mostre a negritude brasileira de diversas formas; dança, retrato, culinária, fotojornalismo, religião, e tudo mais que enriqueça e valorize a cultura afro.

Nesta edição os participantes podem apresentar trabalhos que mapeie e mostre a negritude brasileira em diversas formas: dança, retrato, culinária, fotojornalismo, religião, e tudo mais que enriqueça e valorize a cultura afro.

Os trabalhos devem ser enviados até 03 de outubro de 2010 (valendo o carimbo do correio). Os selecionados receberão certificado de participação, e os melhores farão parte de uma exposição na FUNDEC.

Podem se inscrever com fotografias, coloridas e em preto & branco, que deverão ser enviadas para uma pré-seleção no formato jpeg com qualidade mínima de 800 pixels no lado maior e que não ultrapasse a 50kb para o e-mail: brasilafroselecao@grupoimagem.org.br. Os selecionados serão comunicados por e-mail e terão 15 dias de prazo para enviar as fotos ampliadas no tamanho 30x45cm em papel fosco.

O objetivo é mostrar o trabalho de fotógrafos amadores e profissionais e registrar os costumes e tudo que se refere à cultura afro, bem como os próprios afro-descendentes. Como forma de reconhecimento, a mostra homenageia Jorge Narciso de Mattos pelo seu trabalho e dedicação à causa. As fotografias serão selecionadas por um júri nomeado pela Comissão Organizadora, composto por pessoas reconhecidas no meio fotográfico.

A cada ano que passa cresce o número de participantes, na última edição mais de 200 profissionais de todo o território nacional enviou seus trabalhos.

De acordo com o Presidente do Grupo Imagem, Werinton Kermes, a ação é uma maneira de divulgar novos trabalhos e ao mesmo tempo serve como intercambio cultural. “Nesta mostra fotográfica queremos levar ao público uma parcela significativa da produção fotográfica do país, possibilitando o intercambio entre os fotógrafos dos diversos estados brasileiros, bem como divulgar novos talentos”, definiu Kermes.

O projeto é uma realização do Grupo Imagem Núcleo de Fotografia de Vídeo de Sorocaba, Associação Cultural e Beneficente de Votorantim, Associação Audiovisual de Votorantim Francisco Beranger, Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região, CUT Regional de Sorocaba, NUCAB (Núcleo de Cultura - Afro Brasileiro) FUNDEC – Fundação de Desenvolvimento Cultural de Sorocaba, Consciência Negra de Boituva.

Jorge Narciso de Matos

Jorge Narciso de Matos nasceu em 16 de janeiro de 1945 em Pereiras, estado de São Paulo, foi funcionário público federal, agente do INSS. Membro do Clube Recreativo “28 de Setembro”, do NUCAB (Núcleo de Cultura Afro-brasileira, integrado a UNISO), da Academia Sorocabana de Letras, da Fundação Cafuné (que oferece bolsas de estudo a afro-descendentes). Foi presidente do Rotary e seu governador. Professor da UNISO, onde lecionou História da África. Sociólogo. Diretor da Santa Casa de Misericórdia. Faleceu em 30 de outubro de 2003 vitima de um acidente automobilístico.



VIII BRASIL AFRO


REGULAMENTO

O Grupo Imagem Núcleo de Fotografia e Vídeo de Sorocaba, Associação Cultural e Beneficente de Votorantim, Associação Audiovisual de Votorantim Francisco Beranger, Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região, CUT Regional de Sorocaba, NUCAB (Núcleo de Cultura - Afro Brasileiro) FUNDEC – Fundação de Desenvolvimento Cultural de Sorocaba, Consciência Negra Boituva.

A Mostra tem por finalidade levar ao público uma parcela significativa da produção fotográfica do país, possibilitando o intercâmbio entre os fotógrafos dos diversos estados brasileiros, bem como divulgar os novos talentos nacionais da área da fotografia.

1) a mostra fotográfica Jorge Narciso de Mattos que tem como tema “Brasil Afro”, onde o objetivo é provocar fotógrafos amadores e profissionais a registrar os abetos, costumes e tudo que se refere à cultura afro, bem como os próprios afros descendentes. Como forma de reconhecimento, a Mostra homenageia Jorge Narciso de Mattos pelo seu trabalho e dedicação a causa;

2) as fotografias, coloridas ou em preto & branco, deverão ser enviadas, para uma pré-seleção em formato jpeg com qualidade mínima de 800 pixels no lado maior e que não ultrapasse a 50kb para o e-mail: brasilafroselecao@grupoimagem.org.br até o dia 03 de outubro de 2010.

As fotos selecionadas serão comunicadas por e-mail aos participantes que terão 15 dias para enviar as ampliações no tamanho 30x45cm em papel fosco.

3) No verso das fotografias deverá constar etiqueta adesiva com o nome completo do fotógrafo, seu endereço, telefone e e-mail para contato, cidade, estado, local em que a foto foi feita e um pequeno texto explicando a foto além do título para ser colocado na exposição;

4) As fotografias serão selecionadas por um júri nomeado pela Comissão Organizadora, composto por pessoas reconhecidas no meio fotográfico. As decisões do júri serão soberanas e finais;

5) Os participantes selecionados para a Mostra Fotográfica Brasil Afro receberão certificado de participação.

6) As fotografias deverão ser enviadas ou entregues diretamente no endereço Rua Júlio Hanser, 140 – 3º andar, Jardim Faculdade, CEP. 18031-490 – Sorocaba – SP. –. de segunda a sexta feira, no horário comercial, até o dia 22 de Outubro de 2010. A inscrição será feita automaticamente mediante o envio das fotografias;

8) As despesas de envio correrão por conta de cada participante;

9) A Comissão Organizadora não se responsabiliza por quaisquer danos que os trabalhos possam sofrer no seu envio; (sugerimos que se coloquem as fotos no envelope juntamente com uma base (papelão) e um aviso escrito no envelope para que o carteiro tome cuidado para não dobrar, pois se trata de obra de arte.

(11) As fotografias selecionadas serão expostas na FUNDEC – Fundação de Desenvolvimento Cultural de Sorocaba.

no período de 18 a 28 de novembro de 2010, bem como exposição virtual nos sítios www.grupoimagem.org.br e www.culturavotorantim.com.br

12) Os autores, ao enviar as fotos para a exposição autoriza a utilização de suas imagens na exposição, divulgação na mídia, catálogos e em todo e qualquer evento ou promoção do Concurso;

13) As fotografias selecionadas poderão integrar o acervo Grupo Imagem, desde que a doação seja explicitamente autorizada na ficha de inscrição (disponível para baixar no site www.grupoimagem.org.br e que elas só serão utilizadas exclusivamente na divulgação de projetos culturais;

15) A organização da Mostra fará uma ampla divulgação com os nomes de todos os participantes, com isto estimulando e valorizando a arte fotográfica.

16) A participação na Mostra Fotográfica Brasil Afro implica na aceitação do presente regulamento;

17- Todos que inscrever sua fotografia para participar deste Concurso assumem particular, pessoal e exclusivamente, toda e qualquer responsabilidade, civil e/ou criminal, relacionada com pessoas, animais e/ou objetos retratados nessa obra, decorrentes da concepção, criação ou divulgação da imagem inscrita, excluindo de tais responsabilidades o Grupo Imagem Núcleo de Fotografia e Vídeo de Sorocaba, Associação Cultural e Beneficente de Votorantim, Associação Audiovisual de Votorantim Francisco Beranger, Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região, CUT Regional de Sorocaba, NUCAB (Núcleo de Cultura - Afro Brasileira) FUNDEC – Fundação de Desenvolvimento Cultural de Sorocaba e Consciência Negra Boituva

sábado, 21 de agosto de 2010

I CONGRESSO INTERNACIONAL DE LÍNGUAS E LITERATURAS AFRICANAS E AFRO-BRASILIDADES

A Universidade do Estado da Bahia (UNEB), através do Departamento de Ciências Humanas e Tecnologias do Campus XXIII, Seabra, promoverá o I Congresso Internacional de Línguas e Literaturas Africanas e Afro-brasilidades (CILLAA) de 21 a 24 de outubro de 2010. O evento reunirá personalidades de reconhecimento internacional, oriundas do Brasil; de países africanos e de outros países nas áreas de línguas e literaturas africanas; de identidades nacionais africanas e afro-brasilidades. Na oportunidade, poderemos ouvir e dialogar com várias vozes autorizadas, inclusive de África, estabelecendo contatos diretos.


O CILLAA tem por objetivo principal contribuir para a formação e aperfeiçoamento de profissionais nas temáticas sugeridas por ele, além de oportunizar o diálogo com estudiosos consagrados e entre estes estudiosos no centro geográfico da Bahia. Acreditamos que este será mais um importante passo dado pela UNEB no sentido da formação de professores e demais interessados em temáticas afro e afro-brasilidades.

Apesar de sermos em nossa maioria profissionais das Letras, as discussões interessam às demais humanidades. Há algum tempo que as Letras realizam interfaces com outras áreas, principalmente das Ciências Humanas, com o CILLAA não ocorrerá diferente. O CILLAA é evento calcado nas Letras, mas em constante e obrigatória comunicação com a cultura.
 
Fonte: http://www.cillaa.uneb.br/

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

MESA-REDONDA COM JOÃO MAIMONA, JOÃO MELO E MARTA SANTOS NA UFRJ

MESA-REDONDA COM POETAS E ESCRITORES DE ANGOLA



JOÃO MAIMONA, JOÃO MELO, MARTA SANTOS(nova escritora de literatura infanto-juvenil)

Dia 19 de agosto (quinta-feira),das 10 horas às 12:30,

UFRJ - Faculdade de Letras- Fundão, sala D220

Fonte: E-mail enviado pelo professor Robson Dutra.

domingo, 15 de agosto de 2010

[Livro]Desmedida - pré-publicação Ruy Duarte de Carvalho

Desmedida - pré-publicação Ruy Duarte de Carvalho

fotografias de Daniela Moreau

…estamos é juntos, no vaivém das balsas…

cendrars

(escrito em São Paulo antes de partir em viagem pelo São Francisco superior)

1 – jantar
complicando logo, que é para depois não causar estranheza: que o real se faz mesmo é de repetições, variações e simetrias, acasos, encontros e convergências que o que estão mesmo a pedir é decifrar-lhes continuidades e contiguidades, isso, estou em crer, não tem quem não saiba. Resultaria pedante e redibitório ousar impor como epígrafe a autoridade de uma qualquer citação capaz de dizer o mesmo. Posta a coisa porém desta maneira, ao que conduz, sem remédio, é a uma formulação banal como esta está a ser…
…a estória então, ou a viagem que tenho para contar, começaria assim:
…tem um lugar, dizia eu, tem um ponto no mapa do Brasil, tem um vértice que é onde os estados de Goiás, de Minas Gerais e da Bahia se encontram, e o Distrito Federal é mesmo ao lado. Aí, sim, gostaria de ir… é lá que se passa muita da ação do Grande sertão: Veredas… e depois descer para o alto São Francisco, que é o resto das desmedidas paisagens de Guimarães Rosa… e ao baixo São Francisco, podendo, ia também… porque encosta aos Sertões euclidianos… sou estrangeiro aqui e nada me impede de incorrer no anacronismo de querer ir ver, de perto, Guimarães Rosa e Euclides da Cunha…
veredas - minas gerais
veredas - minas geraisEra isto que eu dizia a duas senhoras paulistanas, sentado à mesa delas numa soberba fazenda de café do interior paulista… Dizia sim, e assim, mas quase tudo, já, a pensar noutra coisa… porque daquela exata maneira quase sempre referida para descrever situações semelhantes, talvez porque não há outra, é que fui agarrado por certa ideia e envolvido numa bolha de temporalidade e de velocidade de pensamento dessas que não têm nada a ver com as durações comuns. Durante os escassos segundos em que dizia esse pouco que disse, eu não estava vendo já nem as senhoras que tinha à minha frente e nem a sala muito extensa e iluminada, de pé-direito altíssimo e de um arranjo que restaurava uma construção por certo muito antiga até, mas muito ao gosto da arquitetura e da decoração restauratórias de agora. Pensava noutra sala de jantar, tão extensa e por certo tão antiga como esta, porém numa fazenda então praticamente abandonada pela proprietária, ausente durante mais de duas décadas, na França. Ela estaria sentada agora ali também na companhia de duas filhas suas, nascidas já em Paris, e de alguém verdadeiramente ilustre, Cendrars, Blaise Cendrars, o escritor, o poeta amputado pela Primeira Guerra Mundial e aventureiro, brilhante e de cigarro, sempre, no canto esquerdo da boca, talvez mesmo até enquanto agora ali jantava… e à volta havia mulheres a servi-los, negras e mulatas, algumas nascidas ainda no tempo da escravatura. Porque tudo isso se passava nos anos 20 do século passado, depois de uma viagem transatlântica que tinham feito juntos, com início em Bolonha e apontada ao porto cafeeiro de Santos.
onde a cobra trocou de pele
onde a cobra trocou de peleDe Cendrars sabia eu alguma coisa porque fui lendo dele, ao longo da vida, o que veio ao meu encontro. Moravagine, continuo a achar, é uma leitura fundamental seja para quem for e até aos dias de hoje, e a sua Antologia negra atingiu-me muito antes de eu próprio me ter metido em aventuras semelhantes. E de fazendas de café também tive a minha experiência. Dos 19 aos 25 anos foi nisso que trabalhei por quase todas as regiões cafeeiras de Angola. E tendo querido as circunstâncias que antes de chegar agora ao Brasil — para acabar por ver-me, naquela noite, sentado ali à mesa de duas senhoras, uma mãe e uma filha, na casa -grande de uma próspera fazenda de café em pleno século xxi —, tendo querido as circunstâncias que eu tivesse, também, passado antes por Paris, o que meti então no bolso para ler durante a viagem de avião até São Paulo tinha sido, precisamente, um livrinho de Blaise Cendrars com várias estórias passadas num interior paulista que só podia ser aquele.
rio s.francisco - minas gerais
rio s.francisco - minas gerais
travessias - minas gerais
travessias - minas geraisCendrars, no tempo dele, tinha vindo ao Brasil numa altura em que brilhava já há mais de dez anos como figura das mais marcantes na vanguarda literária e artística de Paris, depois de ter publicado Les Pâques à New York e Prose du Transiberien et de la petite Jehanne de France, de quem Rilke viria a dizer tratar-se da genial poesia de um cantor de ruas. Esses poemas deram a volta à poesia escrita em francês e mudaram até o rumo do que fazia o próprio Apollinaire, consta. Revelavam um arrojo na desmedida de que não haveria notícia desde Rabelais, dizem os especialistas. Mais recentemente tinha Cendrars publicado Panamá ou l’aventure de mes sept oncles e a tal Anthologie nègre, êxitos seguros do público e da crítica.
Foi então que, na Livraria Americana do Quai des Grands-Augustins, Cendrars deu encontro com o intelectual brasileiro Paulo Prado, figura proeminente da sociedade paulista, membro no ativo de uma das famílias mais poderosas do Brasil, bem-sucedido produtor e exportador de café, mecenas sempre pronto a socorrer artistas que reconhecia capazes, como Heitor Villa-Lobos, por exemplo. Paulo Prado tinha mesmo participado, financiando até, naquele movimento que durante três noites de fevereiro de 1922 promoveu a famosa e importante Semana de Arte Moderna de São Paulo.
Ora encontravam-se também em Paris, na altura do encontro de Cendrars com Paulo Prado, muitos dos protagonistas desse movimento: Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Sérgio Milliet, Di Cavalcanti. Data mesmo daí a apresentação de Tarsila a Fernand Léger, encontro que viria a ter uma grande importância na obra da pintora brasileira.
Barra do Rio Grande - BahiaBarra do Rio Grande - Bahia
Cendrars e Léger andavam então implicados numa aventura que envolvia também, tudo em Paris, Darius Milhaud, Jean Cocteau e os balés suecos. O compositor Darius Milhaud tinha servido como adido cultural na Legação Francesa do Rio de Janeiro em 1917 e 1918, durante o consulado de Paul Claudel — que aliás, naturalmente, também privou com Paulo Prado —, e foi aí que conheceu não só o músico Heitor Villa -Lobos como também um certo Zé Boiadeiro, autor de sambas, chorinhos, tanguinhos e maxixes, entre os quais uma peça chamada Boi no telhado. Voltou à França com materiais e ideias que lhe permitiram agitar o meio parisiense com o seu Boeuf sur le toit. Depois disso é que procurou Cendrars, quando também apareceu a Anthologie nègre, para montar com ele, e com Léger, La création du monde, balé de tema negro levado à cena em outubro de 1923. Terá sido mesmo Darius Milhaud, dizem, a contribuir para que Cendrars aceitasse sem qualquer hesitação o convite que Paulo Prado lhe fez, a instâncias de Oswald de Andrade, parece, para vir ver como era o Brasil.
Cendrars permaneceu então aqui durante alguns meses, no ano de 1924. Fez conferências em São Paulo e andou com Oswald de Andrade, Mário de Andrade e Tarsila do Amaral pelas cidades do ouro de Minas Gerais durante a Semana Santa. Haveria de voltar pelo menos mais duas vezes ao Brasil, em 26 e em 27-28, para passar, sempre que podia, os carnavais no Rio. Comprando fumo de rolo em Cordisburgo Comprando fumo de rolo em Cordisburgo Apaixonou-se por este país a ponto de proclamar, sempre que podia, que esta era a sua Utopiolândia, a sua segunda pátria espiritual — já que a primeira não poderia, evidentemente, deixar de ser Paris. Nos seus poemas, ficções, ensaios, memórias, reportagens, daí para a frente não deixou nunca de celebrar e de glorificar, e durante mais de cinquenta anos, a sua terra de eleição. E tanto a sua vida como a sua obra acabaram por mudar de rumo, depois de ter aqui estado. Chegou como aspirante a cineasta derrotado e deprimido, voltou meses depois à França para escrever, em poucas semanas, L’or, um romance, gênero que nunca tinha praticado e lhe garantiu de imediato um novo e retumbante sucesso. E como resistir a mencionar que foi a partir das suas estadias no Brasil, e a pedido de Paulo Prado, que Cendrars veio a assinar uma tradução que para alguns é uma versão para melhor de A selva de Ferreira de Castro (ao que parece traduzida de fato por um certo Jean Coudures e apenas revista, mas magistralmente, por ele), e que nesse livro é que viria a apoiar-se, também consta, para escrever o seu futuro En Transatlantique dans la Forêt Vierge?
travessias - minas geraistravessias - minas gerais“No Brasil foi grande a sua influência sobre os rapazes que em 22 desencadearam o movimento modernista”, viria a dizer mais tarde Manuel Bandeira. Ele vinha a calhar, referem outros, para tornar-se o avalista estrangeiro do arranque modernista. O movimento Pau-brasil, de Tarsila e de Oswald, terá mesmo nascido e achado o seu tom na companhia de Cendrars, e as suas imagens e obra convinham em absoluto a essa campanha brasileira contra o pieguismo romântico e a “crueza de açougue” do realismo, acrescentam ainda alguns. Tratava-se de cantar, a par de uma brasilidade ainda muito em busca de si mesma, o fluxo da vida moderna, a importância do tempo material, o motor, o asfalto, o cinema, a eletricidade, a iluminação, as engrenagens fabris e a velocidade…
Barra do Rio Grande - BahiaBarra do Rio Grande - Bahia
***
Estou a escrever, agora, alguns meses depois de Cendrars me ter vindo à cabeça enquanto jantava com aquelas senhoras numa fazenda do interior paulista. É evidente que andei entretanto a informar-me sobre Cendrars no Brasil. Naquele momento talvez soubesse só, ou sobretudo me ocorresse apenas de imediato — porque alguma coisa vem dita na introdução do D’oultremer à indigo que trazia na algibeira —, que Cendrars, no Brasil, tinha estado em fazendas de café e que era aí que situava uma boa parte daquilo que o Brasil o levaria a escrever depois.
o recife visto de olindao recife visto de olindaEsteve algumas vezes em propriedades de café da família Prado, nomeadamente nas fazendas São Martinho e Santa Veridiana, e foi aí que utilizou a seu bel-prazer o Marmon, viatura de luxo, que entra na tal estória das senhoras, e um pequeno Ford que Paulo Prado colocava à sua inteira disposição (Cendrars era um apaixonado por viaturas automóveis e num período mais ou menos próspero da sua vida chegou mesmo a ter um Alfa Romeo de desporto com a cabine desenhada por Georges Braque). Mas esteve também, e nunca deixou de referir isso como uma das glórias da sua vida, numa outra fazenda de café à medida exata do seu desvario imaginativo. Aí teria dormido, em 1886, o imperador d.Pedro ii, e imperava nela agora, ou veio a imperar na ficção de Blaise Cendrars, um mais que mítico fazendeiro astrônomo, obstinada e definitivamente apaixonado por uma distante, quiçá jamais divisada, Sarah Bernhardt, a divina.
serra das ararasserra das araras

Cendrars situa essa estória, a das senhoras vindas com ele de Paris, numa fazenda então ensombrada por passados obscuros, e roída por desgostos fundos, a desdobrar-se por dezenas de milhares de hectares de cafeeiros sem seiva, sufocados pelo cupim, arbustos, ervas daninhas e trepadeiras, e queimados pela geada dos nevoeiros que a madrugada congelava, vindos de um lago ao lado, olho de sáurio, na estória de Cendrars, injetado e feroz, onde tudo quanto caía, até as nuvens do céu e a paisagem invertida — e o próprio coração do narrador, doente de amores sem esperança por uma das senhoras mais novas, dona Maria —, era para aí apodrecer e servir de festim a jacarés…
sertãosertãoNão era o caso desta fazenda onde eu agora me achava e me deixava alhear assim, possuído pelas minhas divagações, fulminantes, rápidas, ao ritmo desse tempo alterado que é o do desenrolar de certas percepções, e de que aliás me iria em breve ver recuperado pela conversa efetiva. Esta fazenda, onde eu agora estava, produz muito, e um muito valorizado café, servido como privilégio nos melhores restaurantes de São Paulo… Esta será antes uma fazenda como a do morro Azul, onde Cendrars situou o seu fazendeiro sideral, milhões e milhões de pequenos arbustos uniformemente verdes, do mesmo tamanho e idade, alinhados a perder de vista, cada planta tratada, cuidada, abrigada, numerada… Para que procurar dizer o mesmo de outra maneira se dito assim, como Cendrars falou há mais de oitenta anos, soa tão bem?…
…tem um lugar, dizia eu então, tem um ponto no mapa do Brasil, tem um vértice que é onde os estados de Goiás, de Minas Gerais e da Bahia se juntam, e o Distrito Federal é mesmo ao lado, aí sim, gostaria de ir… é lá que se passa muita da ação do Grande sertão: Veredas… e depois descer daí para o alto São Francisco, que é o resto das paisagens de Guimarães Rosa… e ao baixo São Francisco, podendo, eu ia também… porque encosta aos Sertões euclidianos… sou estrangeiro aqui, nada me impede de incorrer no anacronismo de querer ir ver, de perto, Guimarães Rosa e Euclides…

— E ao médio São Francisco, não? Richard Burton também andou por lá… — pergunta-me uma das senhoras, a mãe, e suspende-se a olhar-me nos olhos.
— Richard Burton?… Sir Richard Burton, I presume — respondo eu suspendendo, pela minha parte, o manuseio dos talheres —, o próprio sir Richard Burton, sim, o da descoberta das nascentes do Nilo, o da viagem clandestina a Meca, tradutor das Mil e uma noites e dos Lusíadas, of course… andou pela Índia, por Goa, Costa do Malabar, pela Pérsia, Egito, Harrar, Crimeia, Zanzibar, África central, Fernando Pó, Camarões, Congo, Daomé, pradaria norte-americana, Salt Lake City, Paraguai, Síria, Trieste… aventureiro e homem de letras, soldado, espião e diplomata… que escreveu dúzias de crônicas de viagem e dezenas de livros, que foi etnólogo, conferencista e tradutor, fluente em 29 línguas. E que praticava, para além disso, hipnotismo e poesia, entre outras coisas…
Forte Orange Ilha de Itamaraca - Pernambuco
Forte Orange Ilha de Itamaraca - Pernambuco
A senhora suspende a suspensão e olha para a filha… Não confundi com o ator… Passei na primeira prova…: — Pois também esse desceu o rio das Velhas, de Sabará a Pirapora, e o São Francisco daí até à foz… E tudo quanto escreveu, dessa viagem, é sempre a dizer mal até que na Barra do Rio Grande, já muito adiantado no estado da Bahia, entre a antiga cachoeira do Bom Jardim e Xique-Xique, encontrou um parente nosso que lhe mostrou a sua coleção de pedras…
— Mãe, conta para ele também como foi daí, da Barra do Rio Grande, e da família, que saiu mais tarde, para o recôncavo baiano, uma menina que veio a casar depois com aquele juiz de direito que acolheu o Antônio Conselheiro em Juazeiro — interrompeu nessa altura a senhora mais nova que era filha, ali…
ruy, represa das três marias
ruy, represa das três marias
Desmedida luanda — são paulo — são francisco e volta, de Ruy Duarte de Carvalho - a sair em breve pela Língua Geral, Brasil (e Cotovia, portugal, 2006 )
Fonte: http://www.buala.org

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

[Luto]Morreu o escritor Ruy Duarte Carvalho

Morreu o escritor Ruy Duarte Carvalho Imprimir E-mail

ImageO escritor, poeta, cineasta, artista plástico, e antropólogo Ruy Duarte Carvalho morreu na sua casa na cidade de Swakopmund, na Namíbia, aos 69 anos, disse esta quinta-feira à Lusa a escritora angolana Ana Paula Tavares.
Português, e naturalizado angolano na década de 1980, Ruy Duarte de Carvalho foi um autor multifacetado, cuja obra se estende das artes plásticas ao cinema, passando pela antropologia e também pela poesia.
Costumava descrever a sua obra como “meia-ficção-erudito-poético-viajeira”.
Nascido em Santarém em 1941, passou parte da infância e adolescência em Moçâmedes, na província de Namibe, mas regressou à terra natal para frequentar o curso de regente agrícola, que concluiu em 1960.
Retornado a Angola, aí exerceu a profissão, percorrendo as grandes regiões angolanas em que se encontram implantadas áreas da agricultura de rendimento, trabalhando no sector da cafeicultura e conhecendo igualmente as práticas agro-pastoris tradicionais, também chamadas de subsistência.
Em 1967, passou a ocupar-se da criação de ovinos caraculo no sul de Angola e quatro anos depois abandonou esta actividade, fixando-se temporariamente em Maputo e Londres.
Na capital britânica, fez um curso de realização de cinema e televisão e em 1974 regressou uma vez mais a Angola.  Mais tarde, entrou para o quadro da Televisão Popular de Angola, onde exerceu as funções de realizador de cinema.
Tornou-se cidadão angolano em 1983 e três anos depois doutorou-se em Antropologia, na École des Hautes Études de Sciences Sociales, de Paris. Lecionou nas universidades de Luanda, Coimbra e São Paulo.

Publicou, entre outras obras, «Vou lá visitar pastores» (1999), sobre os Kuvale, sociedade pastoril do sudoeste de Angola – adaptado ao teatro pelo ator e encenador Manuel Wiborg e estreado na Culturgest, em Lisboa – e “Actas da Maianga – Dizer da(s) guerra(s) em Angola” (2003).

Na poesia, editou «Chão de Oferta (1972)», «A Decisão da Idade» (1976), «Observação Directa» (2000) e “Lavra”, em que reuniu poemas escritos entre 1970 e 2000.

Na ficção, é autor de “Os Papéis do Inglês” (2000), “Como se o Mundo não tivesse Leste” (1977), “Paisagens Propícias” (2005) e «Desmedida» (2006), que lhe valeu o Prémio Literário Casino da Póvoa 2008, entregue no âmbito do encontro de escritores de língua portuguesa e espanhola Correntes d’Escritas.

Depois de estudar cinema, gravou numerosas horas de cinema direto, filmando as populações do sul de Angola e realizou as longas-metragens “Nelisita: narrativas nyaneka” (1982) e “Moía: o recado das ilhas” (1989).

Em 2008, o Centro Cultural de Belém realizou um ciclo sobre a sua vida e obra, o primeiro que dedicou a um autor de língua portuguesa.

Depois de se aposentar, em 2008, passou a residir na segunda maior cidade da Namíbia, Swakopmund, e foi em casa que foi  encontrado esta quinta-feira sem vida.

Fonte: http://www.angoladigital.net/artecultura/index.php?option=com_content&task=view&id=1517&Itemid=39

Texto autobiográfico escrito para o Aeiou Visão  em 2005

Ruy Duarte de Carvalho
Se a habilidade autobiográfica que me é pedida visa situar aquilo que tenho escrito no espaço ultramarino português de ontem e lusófono de hoje, então o que me está a ser sugerido, de facto, é que entre no jogo e aceite essa colocação como eixo do que possa vir a ter para dizer. Assim : Em meados dos anos 50 do século passado desembarquei em Lisboa com uma bicicleta e uma caixa de tintas a óleo na bagagem. Eram preciosas prendas de que tinha conseguido não me separar, uma de aniversário e outra por ter feito o 2º ano do liceu, quando por decisão familiar fui remetido de Moçâmedes para fazer em Portugal, Santarém, num prazo de cinco anos, o curso de regente agrícola. Mas nem da bicicleta nem das tintas a óleo nunca mais voltei a fazer uso. Passei esses cinco anos na condição de aluno interno, a residir no próprio estabelecimento escolar, e tanto as tintas a óleo, que eram o reconhecimento dos meus mais evidentes talentos congénitos, como a bicicleta, que era uma adjectivação de gloriosas adolescências coloniais, foram sacrificadas à disciplina e ao programa da minha estadia em Portugal.Não estou, porém, é claro, a contar a estória pelo princípio. Quando de facto fui embarcado em Moçâmedes, eu estava também a ser remetido ao exacto local do meu nascimento biológico e de onde, mais cedo portanto, tinha vindo com a família, que entretanto emigrava, parar a Moçâmedes. O que me calhou assim na vida, de qualquer maneira, foi estar de volta a Angola com um curso médio já feito quando a maioria dos sujeitos angolanos da minha classe etária com recursos para estudar estava a ser, por sua vez, expedida para faculdades em Portugal e a ver-se colocada nos terrenos de uma placa giratória, dados os tempos que então corriam, capaz de os envolver em oportunas dinâmicas de esclarecimento ideológico, aprendizagem política, encaminhamento militante e eufóricas, redentoras e patrióticas opções juvenis de rumo para a vida.Pelo menos duas consequências maiores para o meu percurso biográfico terão resultado desta configuração das coisas: a primeira é que o lugar onde vim ao mundo sempre constituiu para mim, desde que me lembro a ruminar nas coisas, uma referência de exílio; a segunda é que tudo quanto pela vida fora se me foi revelando e determinando lugar no mundo, sempre acabou por ocorrer de maneira imediata, vivida, empírica, in vivo, a exigir, às vezes, e sem ser pela mão fosse do que ou de quem quer que fosse, opções e acções de vida ou de morte no pleno desenrolar dos acontecimentos. Elaborações e ruminações, teoria ajudando, foi quase sempre só depois.Não me lembro de ter vindo ao mundo, evidentemente, mas em compensação lembro-me muito bem de ter mudado inteiramente, tanto de alma como de pele, uma meia dúzia de vezes ao longo da vida. De que havia uma matriz geográfica e de enquadramento existencial que essa é que era a minha, dei conta aí pelos 12 anos a comer pão e com um ataque de soluços no meio do deserto de Moçâmedes, por alturas do Pico do Azevedo. Isso continua a vir-me sempre à ideia de cada vez que ainda por lá passo e se calhar é para isso mesmo que ando sempre a ver se passo por lá. E de que havia uma razão de Angola que colidia com a razão colonial portuguesa, disso dei definitivamente conta em condições muito brutais, com 19 anos e já a trabalhar como técnico responsável nas matas do Uíge, quando, em Março de 1961, eclodiu ali a sublevação nacionalista do norte.Sobrevivi à justa e a tempo de me refazer de tanta perplexidade e do quadro de horror geral em que me tinha visto envolvido, fruto quer da feroz insurgência quer da perversa e ainda mais feroz repressão à insurgência, quando a seguir, numa noite em Luanda, a atravessar as ruas da Baixa, houve quem me desse a saber, pela via de uns versos, de uma alma de Angola que vinha pronta sob medida para eu ajustar à razão de Angola que o pesadelo do Norte tinha acabado de me dar a entender. E a partir daí passei a invocar esse novo nascimento para ver se conseguia forjar algum sentido para a condição de órfão do império a que a vida, apercebi-me logo, me iria destinar.O máximo que então consegui, para actuar do lado em que passei desde então e até hoje a situar-me, foi que alguns mais-velhos da luta clandestina, durante uns tempos em que habitei Luanda, me atribuíssem mínimas tarefas menores, como dactilografar, para distribuição nos muceques, poemas de revolta de autoria anónima e de esclarecedora má qualidade, também. Mas depois foi uma data de gente presa e quando o instituto do café me colocou, a seguir, primeiro na Gabela e mais tarde em Calulo, perdi e nunca mais consegui restabelecer ligações políticas efectivas com a insurgência nacionalista. O máximo, outra vez, que consegui então, foi ser dado como persona non grata pela administração do Libolo e afastado dali junto com um padre basco e um médico português. Pouco para currículo político.Arranjei então outro emprego e mudei para a Catumbela, para dirigir a pecuária de uma grande empresa açucareira. E foi nessa condição que levei tal volta passados três anos de mim para mim e afundado a criar ovelhas no interior do imenso platô de Benguela, levei então tamanha volta que andei os três anos seguintes a derivar pelo mundo. Estive em Hamburgo, em Copenhaga e em Bruxelas sempre a ver se encontrava traços da insurgência nacionalista, mas quando finalmente consegui chegar a Argel para colocar-me à disposição da luta, ninguém ali me levou a sério, ou então desconfiaram, ou então voluntaristas como eu já lá tinham que chegasse e até nem sabiam o que é que lhes haviam de fazer. Foi depois de ver-me assim perante a evidência de que por ali também não ia dar, e de ter levado as coisas até onde podia, que acabei por encontrar-me um dia, no turbilhão da voragem de tanta viagem, a exercer funções de chefe de fabricação de cerveja em Lourenço Marques Maputo, e estive a seguir em Londres, com um dinheiro que pedi emprestado, a fazer um curso de realização de cinema e de televisão. Na sequência dessa volta toda é que acabei por passar a noite de 10 para 11 de Novembro de 1975 no município do Prenda, às zero horas, que foi uma hora zero, a filmar a bandeira portuguesa a ser arreada e a de Angola a subir ao mesmo tempo.Já nessa altura, quando foi da independência, tinha o primeiro livro de poesia publicado. Depois, de 75 até 81, fiz filmes para a televisão angolana e para o Instituto Angolano de Cinema, e andei durante uns tempos muito entretido a filmar por Angola toda e a pensar que seria bem acolhida essa minha peregrina intenção de dar Angola a conhecer aos próprios angolanos, meus compatriotas. Quando vi que afinal não dava mesmo para continuar a querer fazer cinema, nem aquele que eu queria nem aliás qualquer outro, escrevi um texto académico para juntar a um dos filmes que tinha feito no Sul e obtive com isso o diploma da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais, de Paris, que me deu imediato acesso à condição de doutorando. Foi então o tempo da Samba e dos Axiluanda, de um fora de Luanda dentro de Luanda, e das teses. A partir de 87 passei a dar umas discretas e mal pagas aulas de Antropologia Social em Luanda e fui aproveitando sabáticas para aceitar convites e ir dar aulas também e consumir bibliotecas em Paris, Bordéus, São Paulo e Coimbra. E a partir de 92 arranjei maneira de ir estar, todos os anos, cinco meses com os pastores do Namibe. Decidi então passar a disponibilizar essa informação sem ter de escrever naquele tom da escrita académica ou de relatório, porque disso já tinha tido a minha dose. E foi assim que adoptei a maneira do Vou lá visitar pastores que depois me pôs na pista de uma meia-ficção em que venho insistindo nos últimos anos. E fui também deixando cada vez mais de escrever poemas tal e qual.Hoje continuo a não conseguir andar muito tempo por fora sem devolver-me ao murmúrio de Luanda à noite que sobe das traseiras da minha casa na Maianga, e sem continuar a dar de vez em quando um salto ao Sul, para visitar pastores. E julgo, chegado a esta altura da vida, não poder deixar de ter que entender que o mundo, por toda a parte e não só aqui, se urde e se produz recorrendo sempre, ou quase sempre, ao uso e ao abuso da boa-fé dos outros. Temo não conseguir nunca chegar, mesmo velhinho, a conformar-me com isso e a tornar-me no sujeito bem acabado, dissimulado, pirata, adaptável e finalmente adaptado que nunca, durante toda a vida, consegui ser. Mas acho que também aprendi, entretanto, a rir-me de mim mesmo, das minhas incompetências congénitas e do mau-feitio que neste mundo sou evidentemente o único a ter. E tem uns intervalos em que tudo parece ficar virginalmente vivável, bom e bonito, conforme pensa a onça quando, segundo Guimarães Rosa, não teme nada e vai, guiada só pela alma que tem.
Fonte: http://aeiou.visao.pt/morreu-ruy-duarte-de-carvalho=f569029

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

O vão da voz: a metamorfose do narrador na ficção moçambicana


Em O Vão da voz, Terezinha Taborda revisita o entrecruzamento de voz e de letra. Para tanto, elege, como via metodológica, a “metamorfose do narrador na ficção moçambicana”. Suas reflexões ecoam vozes críticas como as de Alassane Ndaw, Georges Ngal, Lourenço Rosário, Makhily Gassama e vários outros que, encantados com a cópula da voz com a letra, buscaram a força alquímica da transformação da memória do passado no ouro narrativo do presente.
Livro de Terezinha Taborda Moreira
Editora: PUC-Minas
ENCADERNAÇÃO: Brochura  | 252 págs. 
ANO EDIÇÃO: 2005

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

A Formação do Romance Angolano, de Rita Chaves

A Formação do Romance Angolano:
Entre Intenções e Gestos, de Rita Chaves




Resenha por André Luís da Silva Sampaio - Mestrando em Letras – Universidade Federal Fluminense - Brasil
E-mail: andresampaio2000@yahoo.com.br


Rita Chaves, professora doutora do departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Uiniversidade de São Paulo, publicou pela área de Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa a obra "A Formação do Romance Angolano: Entre Intenções e Gestos". neste livro, que foi sua teses de douturado defendida em 1993, Rita, pioneira neste estudo, analisa a obra de quatro dos grandes autores angolanos: Assis Jr, Castro Soromenho, Oscar Ribas e José Luandino Vieira. Rita Chaves não elegeu esses autores ao acaso, pois eles foram os responsáveis pela iserção do gênero na literatura angolana.

A literatura como já se sabe, possui um papel singular na busca da identidade nacional, foi através dela e da arte em geral, que o Brasil conquistou essa noção de nacionalidade; e em Angola também ocorreu o mesmo processo. A literatura, principiada pela impresnsa levou Angola à independência tomados pelo exemplo do Brasil, angolanos encontraram na literatura a arma necessária para garantir sua libertação do domínio português.

O Livro divide-se em nove partes, contanto com o prefácil do escritor Pepetela, expoente da literatura africana de língua portuguesa. Logo em seguida, Rita traz uma introdução abordando o trajeto dos escritores no ato de escrever e da luta pela independência através da literatura. Traz também na introdução, o difícil cenário encontrado em Angola tendo sua identidade dividida e transformada pela colônia portuguesa.

Ainda na introdução, Rita como na obra inteira, elucida a importãncia da tradição oral na preservação da memória e da tradição:

"Como em tantos outros lugares as "estórias" contadas pelos mais velhos, conforme declara Manoel Rui, cumpriam o papel de transmitir a sabedoria e humanizar o reino das relações que os outros elementos completavam. (CHAVES, 1993, p.20)



Em contra partida, Rita apresenta o papel que a escrita teve na organização social em Angola depois do atirar dos canhões e completa dizendo:


Trazida com os tiros, a escrita corresponde a uma espécie de ruptura que será convertida em nova forma de sentir e dizer. Transformando-se em maneira de  presentificar experiências e organizar o real, a palavra vai sendo trabalhada no sentido de preencher o vazio entre o homem e o mundo, agora redimensionado, nessa nova etapa do chamado processo civilizatório. Violenta e irreversível, a quebra se deu; mais tarde, caberia à literatura ali produzida a tarefa de rejuntar pedaços para a composição de uma nova ordem. - (CHAVES, 1999,p.20)



No capítulo seguinte, intitulado Literatura e nacionalidade no Contexto colonial, depara-nos com o processo pelo qual o homem angolano foi submetido a passar e dele encontrar saidas para combater o inimigo próximo na busca do seu lugar, primeiramente como ser humano e em seguida como um homem que possui nação e identidade própria. E assim, a autora parte para o capítulo seguinte, Assis Jr.: A opção pelo Gênero, iniciando sua análise principal, que é a de encontrar através da obra dos autores escolhidos, o nascer da indentidade nacional angolana após o dominio português.

Os capítulos seguintes, Castro Soromenho: a matriz Neo-Realista, Oscar Ribas: Tradição e Pudor na busca da identidade Nacional e José Luandino Vieira: O Verbo em Liberdade, Rita parte para a análise profunda da obra desses autores e enfatiza cada traço marcante e cada papel que cada um obteve na formação do romance angolano e na formação da tão sonhada identidade, verdadeiramente angolana. Depois da leitura de dez obras escritas pelo autores acima citados, o último capítulo, a conclusoa, finaliza a obra "A Formação do Romance Angolano". Na conclusão Rita enfatiza o poder da tradição oral, que garantiu o recontar das estórias guardadas pelos mais velhos e retomadas pelos escritores. Em um outro molde, o romance, que nasce em Angola para garantir de certa forma, a memória de seu povo, qeu durante muito tempo correu o risco de desaparecer. Mas que pela astúcia e coragem dos escritores permanece viva palara Angola e para o resto do Mundo, inclusive Portugal.

O trecho a seguir, do prefácil escrito por Pepetela, traduz o sentido de toda a obra, abordando a realidade vivida pelos autores e transportadas para seus livros:


"castro Soromenho tratou decididamente situações não só rurais mas também de zonas muito afastadas dos principais centros urbanos da costa. Assis Junior é ainda em certa medida um homem do século passado, enquanto Luandino Vieira é produto da Segunda Guerra Mundial. Oscar Ribas tem posições políticas menos evidentes que os outros. Diferenças, diferenças... E no entanto há uma mesma alma a vibrar, há esperanças soltas no ar, apregoadas na obra de uns, apenas murmuradas na de outros. Mas em todas elas podemos ler uma nação a despontar.(Pepetela apud CHAVES, 1999, p.15.)

Segundo, ainda Pepetela, Rita Chaves ao "tratar da formação do romance angolano a partir de quatro escritores de origens e vivencias muito diferentes", acabou por ligar "estreitamente essa gêneses à do nacionalismo"(Pepetela apud CHAVES,1993, p.14.) De fato, Rita através de sua análise traz a tona o verdadeiro desejo dos autores, denunciar a condição de colonizados no sentiro de obter a libertação, desejada desde o século XIX.


A obra é riquíssima em vários aspectos, desde de sua apurada escrita até o seu relevante tema, que envolve a cada capítulo lido. Rita Chaves possui um olhar crítico e dinâmico do processo ocorrido em Angola e por isso fala com propriedade de cada fato importante na obtenção da liberdade e na reconstrução da nação angolana.

Rita Chaves traz de volta a importância dos estudos da oralidade, que na atualidade ganham um novo espaço dentro dos centros acadêmicos de todo mundo. Pelo fato de ser pioneira no Brasil na área, e por ter defendido sua tese em 1993, Rita não citou autores de extrema importância, como Paul Zumthor que trata do tema oralidade na obra a Letra e a Voz (Companhia das Letras, 1987) e Hommi Bhabha e Stuart Hall que lidam diretamente com os aspectos culturais como a diáspora, efeitos da colonização e da sobrevivência das minorias, de certo, pelo fato de serem teóricos modernos. Se a obra de Rita Chaves ganhasse uma nova ed ição seria de extrema
valia a inserção dos conceitos dos teóricos mencionados. Porém, A Formação do Romance Angolano: Entre intenções e Gestos , não deixa de ter uma grande importância no estudo literário e histórico, já que através de sua leitura o Brasil pode conhecer um pouco mais da arte dos nossos nobres vizinhos africanos, que se comunicam com a mesma língua, a portuguesa, e possuem a mesma condição: a de um país que busca a sua própria identidade.


CHAVES, Rita. A Formação do Romance Angolano: Entre Intenções e Gestos.
Coleção Via Atlântica, n° 1. São Paulo, 1999